08/05/2006

Discurso Comemoração do Aniversário do Concelho - 2006

Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal de Alcanena
Exmos. Representantes dos Partidos Políticos
Exmos. Vereadores
Demais autarcas
Minhas Senhoras e meus Senhores,

Faz precisamente neste dia 92 anos que Alcanena traçou o seu encontro com o futuro. A 8 de Maio de 1914, os fundadores e promotores do nosso concelho, com preserverança, ambição, coragem e capacidade de poder assinalaram inequivocamente a história da nossa terra. Esse futuro por eles idealizado deveria ser hoje o nosso presente.

Com efeito, as efemérides são sempre memória do encontro da história com o tempo. E porque as efemérides se repetem, mas a história não, desse reencontro anual decorre o risco de se celebrar a mera repetição do dia e de se perder, cada vez mais o sentido de abertura à história, que marcou a nossa memória colectiva.

Uma forma tentada ao longo dos anos para que esta cerimónia de homenagem o seja cada vez menos à data e mais à história que nela se inicia, foi a de fazer dela um momento de reflexão sobre o nosso tempo.

De facto, nenhum outro dia, nas efemérides comemoradas no concelho, é mais apropriado a que o tomemos como uma encruzilhada entre o que foi e o que há-de vir – entre o ontem e o amanhã.

A comemoração do aniversário do Concelho de Alcanena é, assim, uma ocasião propícia para reflectirmos sobre o que desejamos do nosso poder local, o que esperamos do papel e do funcionamento dos seus diversos intervenientes, o que é exigível do comportamento dos eleitos e demais agentes políticos, o que deve ser feito para que os cidadãos do nosso concelho ganhem uma nova confiança e respeito pela actividade política e, para que o interesse pela causa pública se revitalize e suscite na juventude do concelho maior motivação e entusiasmo.

Parece-me, deste modo, útil, perante todos os presentes e a opinião pública, lançar um olhar sobre o que nos rodeia. Confrontar o hoje com os sonhos que marcaram aqueles dias de Maio de 1914, mas que a realidade dos nossos tempos, não só não valida, como em vários aspectos nos interpela.

Refiro-me, em particular, ao sonho de desenvolvimento, de progresso e de autonomia, da construção de uma sociedade mais justa e equilibrada, em que os benefícios do desenvolvimento contemplassem todos.
É inegável o progresso registado, no nosso concelho, em alguns sectores da sociedade, a capacidade competitiva de algumas empresas, a excelência de alguns centros de investigação e inovação, a qualidade de serviço de muitas instituições. Mas não é menos inegável que essas experiências de vanguarda, e que a todos nos orgulham, não conseguem impregnar todo o tecido económico e social, coexistindo os nichos de modernidade aparente com expressões de indisfarçável ruralismo social e cultural.

É este o retrato do nosso concelho.

De um concelho de pleno emprego, que todos os presentes conheceram e exaltavam, a um concelho sem visão, rumo ou estratégia aparente, apenas 22 anos nos separam. 22 anos é o tempo que delimita as diferenças que se assistem em concelhos vizinhos que transformaram as suas capacidades produtivas e de atracção de população em marcos de desenvolvimento reconhecidos a nível nacional.

Alcanena, pelo contrário, tem sabido transformar as suas forças em fraquezas, e as suas debilidades em misérias.

O panorama nacional e mundial pode servir de desculpa, mas não justifica todas as ocorrências. Não justifica a falta de investimento nos aspectos económicos, por exemplo. Não justifica os esbanjamentos dos sucessivos executivos em obras de fachada ou em espectáculos de “cultura” para as gentes do concelho, em despesas de manutenção, em viaturas, salários ou comunicações.

Pão e circo podem cegar o povo, mas não evoluem as sociedades.

As maiorias sucessivas resultantes dos últimos actos eleitorais autárquicos têm dado a estabilidade necessária para que executivo pudesse tomar as medidas adequadas, mas não lhes têm dado a visão dos erros que têm cometido ao longo dos anos e que hoje são mais que notórios.

Minhas senhoras e meus senhores,

É necessário parar de errar.

A hora é de planeamento. De parar para pensar o que o concelho precisa. Não se pode continuar a esbanjar dinheiro dos munícipes em obras como as requalificações de Alcanena e Minde, que tanto lesou comerciantes e moradores, pelo tempo que demorou, pelos percalços que teve e que pela qualidade em nada dignifica o concelho, constituindo, antes, um exemplo de má aplicação dos dinheiros dos fundos comunitários.

O próximo quadro comunitário de apoios avizinha-se como o último que Portugal irá usufruir. Tem que ser aproveitado ou corremos o risco de ficarmos a chorar sobre o leite que ainda não derramámos.

O documento Alcanena 2013, se se pretende assumir como um plano operacional para o concelho, deve ser, antes de mais, um instrumento vinculativo da vontade do Executivo em resolver os problemas do município. Deve ser uma análise real dos nossos problemas e do estado das nossas dificuldades e não mais uma forma de se analisar os problemas que se conhecem, para os quais as soluções são conhecidas mas cujas acções não passam de promessas feitas ao eleitorado de 4 em 4 anos.

Arriscamo-nos a ficar num concelho de interior, com população envelhecida e que fala todos os dias que ainda é possível recuperar o concelho porque as acessibilidades existem.

Se daqui a um ano ainda estivermos a falar nas zonas industriais que deviam de existir, nos apoios e incentivos aos jovens e à sua fixação no concelho, nas apostas no turismo que devem ser feitas, por exemplo, estamos a trair os sonhos e a esperança daqueles que lutaram, há 92 anos, pelo melhor para os seus filhos e netos, daqueles que lutaram por um concelho independente do de Torres Novas.

Minhas senhoras e meus senhores.

Recuso a resignar-me ao estado das coisas, nem tão pouco me quero limitar ao seu diagnóstico. Quero apelar a uma intervenção mais ampla e mais coerente naquilo que, mais do que uma soma de dramas individuais, é – e deve ser – um peso na nossa consciência colectiva.

Quero-vos propor um compromisso cívico, um compromisso para o desenvolvimento do concelho e das suas gentes.

Um compromisso que envolva não só as forças políticas, mas que congregue as instituições, os agrupamentos da sociedade civil, dos sindicatos às associações cívicas e às instituições de solidariedade.

A elaboração do documento Alcanena 2013, uma iniciativa louvável da parte do executivo, que à grande maioria ainda diz tão pouco, deve ser aproveitada para uma mobilização geral, uma verdadeira campanha em prol do desenvolvimento concelhio.

Deve dar origem a um plano operacional que consiga superar o tradicional enunciado de medidas, definindo uma estratégia coerente para um futuro mais promissor.

O desafio que aqui deixo é que todos nos unamos em torno do desenvolvimento do concelho, sendo mais exigentes com este executivo, mas também connosco próprios, envolvendo-nos cada vez mais nos assuntos da nossa terra, preocupando-nos com eles porque também são nossos.

Para terminar, deixo um desafio ao executivo, na pessoa do senhor Presidente da Câmara.

O desafio que proponho é para que estabeleça objectivos claros e exigentes, objectivos que todos possam avaliar e criticar.

O desafio que proponho é que peça para ser avaliado, não pela beleza dos jardins e fontes de betão, nem pelas rotundas, nem pelos pavilhões, nem pelos passeios que promove, mas pelas marcas de desenvolvimento sustentável que enraizou no concelho.

O desafio que proponho não é para daqui a quatro anos, mas já daqui a um ano, pelo trabalho que desenvolveu e pelo que criou como bases fundadoras do desenvolvimento económico concelhio que parece não ter forma de arrancar.

O desafio que lhe coloco não é de fazer ou tentar fazer tudo isto sozinho. Pelo que lhe digo que pode contar comigo, como tem feito até agora, para o auxílio que necessitar, pois o meu entendimento da causa publica não termina nas críticas construtivas que tenho feito ao seu executivo, não termina nas propostas que apresento, por vezes chumbadas, não se encerra nas posições contrárias que assumo, mas sempre justificadas, não se esgota nos elogios que faço ao executivo quando de direito, não acaba nas moções de solidariedade para com o executivo que proponho, como foi no caso do PIDDAC, mas começa em todo o trabalho que possa ajudá-lo a desenvolver este concelho que é nosso e que todos queremos ambiental, social e economicamente desenvolvido.
Vamos ter preserverança, ambição, coragem e capacidade de poder como outrora o tiveram os fundadores deste nosso concelho.

Viva o Concelho de Alcanena!